O Brasil precisa importar médicos?
Governo decide trazer seis mil profissionais de saúde cubanos para as áreas mais remotas do País, onde, apesar dos salários mais altos, brasileiros não querem se estabelecer. As associações médicas reclamam que isso não é a solução!
Na contramão da importação de profissionais de saúde, estudantes têm saído do Brasil para cursar faculdade de medicina em países vizinhos, animados por anúncios na internet que vendem pacotes para intercâmbio com “mensalidades baratas” e “sem vestibular”. Aos 32 anos, Dora Flores de Navarro, de Tabatinga, frequenta o quarto ano de medicina na Universidade Privada Aberta Latino-americana, em Cochabamba, na Bolívia. Os pais comerciantes se esforçam para enviar os US$ 130 de sua mensalidade e de seu irmão, Marcos Davi, que está lá pelo mesmo motivo. Os dois miram-se no exemplo de Sara, a irmã pioneira formada na Universidade Privada Aberta Latino-americana e empregada no Brasil. “Não foi fácil, mas, se ela conseguiu revalidar o diploma, acho que a formação que recebemos aqui atende às exigências do Revalida”, diz Dora.
Nathalia Ziemkiewicz
CONTRAMÃO
Dora Inês Flores de Navarro Assessora do Intercâmbio Médico.
Encravada na tríplice fronteira
Brasil-Colômbia-Peru, Tabatinga é uma cidade amazonense com cerca de 50
mil habitantes. Quando um dos moradores das comunidades ribeirinhas do
rio Solimões adoece, tem de torcer pela visita de um barco da Associação
Expedicionários da Saúde ou de enfermeiros, pois médicos por lá são
coisa rara. Os poucos doutores que circulam são imigrantes ilegais dos
países vizinhos, em busca de remuneração mais atraente. “Os brasileiros
não aceitam trabalhar nesses locais sem infraestrutura”, afirma o médico
Ricardo Affonso Ferreira, presidente da ONG. “Só aqueles muito
idealistas mesmo.” Na região Norte, a média é de um médico para cada mil
habitantes, segundo pesquisa divulgada em março pelo Conselho Federal
de Medicina (CFM). Diante desse diagnóstico alarmante, o governo
anunciou na segunda-feira 6 um acordo para importar seis mil médicos
cubanos para os municípios brasileiros geograficamente isolados e
carentes de assistência do Sistema Único de Saúde (SUS).Dora Inês Flores de Navarro Assessora do Intercâmbio Médico.
INTERCÂMBIO
Médicos cubanos (acima) serão deslocados para atuar em regiões carentes de
profissionais de saúde, como a Amazônia (abaixo), desprezadas pelos colegas brasileiros
Os conselhos regionais e associações de medicina criticaram a medida, chamando-a de “irresponsável” e “temerária”. Isso porque, para atuarem no Brasil, todos os médicos com diploma no Exterior são obrigados a prestar o Revalida, exame em português que testa a qualidade da formação profissional. Em 2012, apenas 11% daqueles que estudaram em Cuba foram aprovados. O resultado chama a atenção. Primeiro, porque há um médico para cada 175 cubanos, um excelente índice – no Reino Unido, essa proporção é de um para 600. Segundo, porque a medicina do país sempre foi exaltada, motivo de orgulho e prioridade do Partido Comunista. Talvez a formação generalista dos cubanos seja um dos empecilhos ao desempenho na prova brasileira. Vice-presidente do CFM, Carlos Vital acredita que o curso de medicina de muitas universidades latino-americanas nem sequer equivale ao nosso de enfermagem no Brasil. “É comum encontrar um ensino precário e instituições que são verdadeiras arapucas”, diz Vital. Para ele, seria indigno oferecer “pseudomédicos” para a parcela mais vulnerável da população, atendida pelo SUS. As associações médicas classificam o acordo Brasil-Cuba de eleitoreiro. Alegam que a política pública eficaz seria a destinação de mais recursos para o setor, “um mínimo de 10% da receita bruta da União”, para aprimorar toda a rede de serviços de saúde gratuitos.
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